Pagamento de precatórios em 2020 e a Covid-19

Requisição de  Pagamento é a comunicação formal expedida pelo Judiciário para requisitar aos entes públicos (União, Estados, Municípios, DF, bem como suas autarquias e fundações),  pagamento de suas dívidas originadas em condenações judiciais definitivas, valores devidos após condenação judicial definitiva.

Por meio dela, o Governo respectivo identifica a quantia certa a ser paga ao beneficiário, que pode ser pessoa física ou jurídica, que contra ele venceu definitivamente alguma ação judicial condenatória. Um dos seus principais objetivos é organizar a gestão das dívidas judiciais. Isso possibilita que os entes públicos realizem os pagamentos de forma programada e padronizada, o que ajuda a não prejudicar seus orçamentos.

Existem duas espécies de requisições: Precatório ou RPV. De forma geral, tanto o Precatório quanto a RPV representam o reconhecimento judicial de uma dívida por parte de algum ente público. A variação de tipo dar-se-á pelo valor da requisição. Enquanto o Precatório é para valores acima de sessenta salários mínimos, a RPV possui limites diferentes nas esferas municipais, distrital, estaduais ou federais.

As Requisições de Pequeno Valor (RPV) são pagas num prazo de até 60 dias a partir da data de recebimento pelo Tribunal responsável pelo pagamento.

 

Os Precatórios são submetidos ao seguinte regramento: as requisições enviadas aos Tribunais até a data de 01/07 de um exercício, devem ser pagas até o último dia do exercício seguinte.

Em ambas as hipóteses os valores são atualizados monetariamente até a data do pagamento. Os pagamentos dos Precatórios são feitos na ordem cronológica de apresentação das requisições aos Tribunais. Contudo, os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.

A União encontra-se em dia com os pagamentos das requisições preferenciais encaminhadas aos Tribunais até 01/07/2018, tendo em vista que as mesmas foram quitadas em abril do ano de 2019. Infelizmente, a realidade não é a mesma em todo o país, eis que muitos Estados e Municípios não conseguem manter os pagamentos das dívidas em dia.

Especificamente quanto aos precatórios alimentares federais que entraram na listagem orçamentária até 01/07/2019, cujo pagamento está previsto para ocorrer até 31/12/2020, ainda há incerteza sobre a data do pagamento pela União, tendo em vista a pandemia da COVID-19.

 

Em 30/03/2020, o Senador Otto Alencar (PSD/BA) apresentou o Projeto de Decreto Legislativo – (PDL) nº 116/2020 -, perante o Senado Federal, cuja ementa segue abaixo:

“Susta os efeitos da Resolução nº 303, de 18 de dezembro de 2019, do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre gestão dos precatórios e respectivos procedimentos operacionais no âmbito do Poder Judiciário, enquanto persistir à emergência de saúde pública de importância nacional em decorrência da Infecção Humana pelo coronavírus (COVID19).”

 

Em 13/04/2020 houve a proposição da Emenda nº 01 ao PDL, pelo Senador Fernando Bezerra Coelho (MDB/PE), justificando que a sustação do efeito tenha a mesma duração do Decreto Legislativo nº 06/2020, que reconhece o estado de calamidade pública nacional.

 

Em 15/04/2020 houve a proposição da Emenda nº 02 ao PDL nº 116/2020, pelo Senador Luis Carlos Heinze (Progressistas/RS), acrescentando parágrafo único ao artigo 1º do PDL, in verbis:

“Parágrafo único: Não se aplicam as determinações do caput nos casos de precatórios federais alimentares com pagamento previsto no corrente ano, bem como precatórios de qualquer natureza devidos a idosos, incapazes, inválidos ou pessoas portadoras de qualquer deficiência, garantindo-lhes o pagamento mesmo durante o período de vigência do estabelecido no art. 1º do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.”

 

Na mesma data referida no parágrafo anterior, o Presidente da OAB Nacional, Felipe Santa Cruz, juntamente com os presidentes das comissões Especial de Precatórios, Eduardo Gouvêa, e Especial de Direito Previdenciário, Chico Couto, e ainda com o apoio de 24 entidades, encaminhou ofícios ao presidente do Senado Federal, David Alcolumbre, e ao secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Facundo de Almeida Júnior, em que pede o imediato pagamento dos precatórios, com previsão orçamentária para 2020.

 

A Ordem e as entidades apontam que, na contramão do atendimento às necessidades do grupo de risco da Covid-19, está com votação prevista o Projeto de Decreto Legislativo 116/2020, de autoria do senador Otto Alencar (PDS-BA), com o escopo de sustar os efeitos da Resolução 303/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), sob o fundamento de que a liberação dos precatórios seria prejudicial ao enfrentamento da pandemia.

 

O pedido do imediato pagamento de precatórios justifica-se, pois parte significativa dos beneficiários são idosos ou portadores de doença graves ou crônicas. No ofício, a Ordem chama a atenção para o fato de que pesquisas mundiais apontam que a taxa de letalidade da Covid-19 é maior entre os idosos e os portadores de doenças graves e crônicas: “Os idosos e os enfermos que compõem o grupo de risco de infecção pelo coronavírus também representam a maior parcela de beneficiários dos precatórios, em razão do longo tempo de tramitação dos processos judiciais que envolvem a Fazenda Pública. Para preservar a saúde e a integridade física dos cidadãos que se encontram nessa situação de vulnerabilidade, é imprescindível a imediata liberação dos valores referentes aos precatórios com previsão orçamentária para pagamento em 2020, cuja importância é inquestionável pela natureza alimentar do crédito”, diz o ofício da OAB.

 

Segundo a Ordem, decreto legislativo não é sequer instrumento normativo idôneo para sustar efeitos de resolução do CNJ, pois PDL deve tratar somente das matérias previstas nos artigos 49 e 62, parágrafo 3º, da Constituição: “O inciso V, do artigo 49 da Constituição, é claro ao determinar que somente atos do Poder Executivo podem ser sustados por decreto legislativo, o que não é o caso da Resolução 303/2020 do CNJ”.

 

E continua a argumentação da OAB: “Considerando, portanto, que o pagamento de precatórios é medida imprescindível para o combate ao coronavírus, justamente por garantir liquidez aos idosos e aos enfermos, tal proposição é contrária ao enfrentamento da pandemia. Como já estão previstos no orçamento de 2020, a liberação dos valores não é influenciada pelo contexto da crise atual e o não pagamento ofende, a um só tempo, ordem dos Poderes Executivo e Judiciário, em afronta ao princípio da separação dos poderes”.

 

Com isso, espera-se que o PDL nº 116/2020 não seja aprovado, pois além dos vícios formais, das emendas acrescentadas e do apelo da OAB Nacional e de diversas outras entidades, o ponto principal da análise é que além do valor total dos Precatórios já estar inserido no orçamento de 2020, o ingresso do numerário trará enorme benefício ao país, pois além de alavancar a economia de modo geral, ainda socorrerá a milhares de idosos e portadores de deficiências, que são os que mais podem sofrer com os riscos trazidos pela pandemia.

 

Marcela Villatore da Silva

Advogada. Associada do Bin Advogados. Formada pela UFPR. Atua principalmente nas áreas de Direito Civil, Processual Civil e Administrativo. Pós-graduada em Direito Processual Civil e também em Direito Contemporânea e suas Instruções Fundamentais.

 

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